Durante anos psicólogos e psiquiatras tentaram medir as capacidades cognitivas através de inúmeros quocientes. Alfred Binet e Theodore Simon criaram o primeiro teste de "inteligência" em 1905 e, por volta de 1912 sua medida passou a ser conhecida como Intelligenz-Quotient (nomenclatura dada pelo alemão William Stern), ou, abreviado e em português, QI. Por volta dos anos 20 começou a surgir nos Estados Unidos um novo conceito, a inteligência social, dividindo as capacidades mentais em "diferentes inteligências", baseados especialmente na incapacidade dos testes de QI em medir com precisão as capacidades cognitivas (o desvio da relação entre QI e notas escolares é um decepcionante 50%). O conceito da inteligência emocional surgiu nos anos 80 com Wayne Payne, Peter Salovey e Jack Mayer e se popularizou em 1995 com o primeiro dos vários livros sobre o assunto de Daniel Goleman. Adicionando à inteligência puramente cognitiva, o QE, como é conhecido, mede a competência pessoal (dividida em auto-conhecimento e auto-gerenciamento) e a competência social (dividida entre conhecimento social e gerenciamento social) (o QE é um conceito profundamente disputado e diferentes pesquisadores dividem esta mesma inteligência em diferentes medidas).
Voltando às medidas puramente cognitivas (o foco deste texto e do texto que o inspirou) no ano passado a Nintendo lançou um título para o Nintendo DS chamado 東北大学未来科学技術共同研究センター川島隆太教授監修 脳を鍛える大人のDSトレーニング (ou, resumindo, traduzindo e deixando de fora boa parte do título, Brain Age). O jogo é baseado no livro do professor Kawashima Ryūta, conhecido no ocidente como Treine seu cérebro: 60 dias para um cérebro melhor. Segundo o professor Kawashima, o segredo de manter boas funções cognitivas é manter o cérebro bem exercitado, e portanto, jovem. O jogo de DS deve ser jogado alguns minutos por dia e apresenta ao usuário, ao final de cada sessão, uma estimativa da idade cerebral do mesmo. Quanto menor for a idade cerebral em relação à idade cronológica, mais saudáveis estão as funções cognitivas. (este é o exato oposto do conceito de idade mental, de onde deriva a medida de QI, e que postula que inteligências inferiores resultam em idades mentais inferiores à cronológica e vice-versa).
Como parte de uma série sobre a ciência do aperfeiçoamento humano, a revista Wired (disclosure: sou um fã baba-ovo da Wired desde seu surgimento 14 anos atrás e não passo um mês sem lê-la) mandou o reporter Joshua Green passar quatro semanas tentando aperfeiçoar suas funções cognitivas. No início da primeira semana Green, que tem 34 anos de idade, mediu desesperadores 44 anos no Brain Age. Vários neurocientistas consultados por Green fizeram a mesma sugestão: melhore sua dieta; vitaminas e proteínas são vitais para boas funções cognitivas. Green passou a tomar cafés-da-manhã (lembrem-se, americanos não almoçam) de suco de laranja e muffins integrais com manteiga de amendoim. Seguindo o conselho de um professor de medicina do sono de Harvard, Green passou a dormir nove horas por dia (o número ideal é de 8,2 a 8,4 horas de sono, o que exige no mínimo 9 horas na cama). Na segunda semana Green, seguindo a sugestão de mais neurocientistas, passou a escovar os dentes com a mão oposta e a tomar banho de olhos fechados (tarefa que ele achou tão complicada que precisou de um tapa-olho e um tapete de borracha para conseguir). Tais tarefas melhoram a propriocepção (orientação espacial relativa, tanto do ambiente como dos próprios membros) e abrem novos caminhos neuronais. Levando a sério o conturbado "Efeito Mozart", Green passou também a ouvir concertos do compositor durante o banho.
Na terceira semana Green fez duas descobertas interessantes. A primeira foi a de que, mesmo sem seu DS por perto, ele poderia treinar suas funções cognitivas em diversos sites (happy-neuron.com e mybraintrainer.com são dois exemplos) e a segunda foi, sem nenhuma surpresa, o café: Green descobriu que sua coordenação visuo-motora melhorou em 5,5% logo após uma xícara matinal. Na quarta semana, Green fez seu teste final no Brain Age. Passou pelos testes de Stroop, sequências de fórmulas matemáticas e labirintos alfanuméricos com uma facilidade muito maior do que no começo do mês. No final, o jogo deu seu veredito.
Joshua Green, 34, um mês de treinamento, tem o cérebro de um homem de 33 anos. Great success!
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[ваκκєr]
P.S. Algumas vezes algo que eu quero expressar não pode ser dito (apenas) com palavras, então vai parar em meu fotolog ao invés de aqui. Confira-o de vez em quando.
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2 comentários:
antes, um pequeno comentário... ao bater o olho naquele monte de kanjis juntos, pensei que você estava escrevendo em chinês. Daí um ou dois kanas e tudo resolvido. Eita título original ruinzinho de ler!
Mas é incrível como essas coisas, aparentemente tão pequenas, compõem hábitos saudáveis que normalmente ignoramos. 'Coisas da vida moderna' é uma resposta fácil demais.
(e o lance do efeito Mozart... tsc)
Bem gostei muito ,se isso for realmente verdadeiro tenho que mudar bastante.
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